No dia 7 de agosto de 2021, a Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, popularmente conhecida como “Lei Maria da Penha”, comemorou 15 anos de vigência e traz reflexos no contrato de trabalho da mulher.
Essa lei tem por objetivo criar mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, além de estabelecer medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.
Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhes asseguradas, as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social.
Cabe à família, à sociedade e ao poder público criar as condições necessárias para que a mulher usufrua de condições para o exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.
No âmbito do trabalho, uma das repercussões trazidas por essa Lei, consiste na manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento da mulher do local de trabalho, por até seis meses.
O afastamento do trabalho deverá ser julgado pelo juiz da vara especializada em violência doméstica e familiar, e na falta deste, o juízo criminal, mas não o juiz trabalhista, até porque, não está ele em contato efetivo com toda a situação de vulnerabilidade da mulher para saber a real necessidade de seu afastamento do trabalho.
Paira uma celeuma sobre os efeitos desse afastamento no contrato de trabalho: a mulher afastada do trabalho tem direito ou não ao recebimento de salário nesse período?
Em artigo recentemente publicado no “Conjur”, noticiou-se decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça que decidiu que a mulher afastada do trabalho, em decorrência de violência doméstica e familiar tem direito ao recebimento de salário durante os primeiros 15 dias, pagos diretamente pelo empregador e os dias remanescentes do afastamento, deverão ser custeados pelo INSS, por meio do recebimento de auxílio-doença.
A vítima de violência doméstica não poderá ser prejudicada por medidas protetivas instituídas a seu favor.
Com efeito, observa-se, tratar de hipótese de interrupção do contrato de trabalho e por tal motivo, a mulher terá direito ao período aquisitivo de férias, desde o afastamento, uma vez não ser ele superior a seis meses.
Quanto a necessidade ou não do pagamento do FGTS, uma vez não disposta tal previsão específica na Lei nº 8.036/90 “Lei do FGTS”, avalia-se desnecessário o recolhimento pelo empregador, mas apenas durante o período em que a trabalhadora estiver percebendo o benefício pelo INSS, sendo certo, que em relação aos primeiros 15 dias de seu afastamento sob a responsabilidade da empregadora, é devido o seu recolhimento.
Aquele mesmo juiz que determinou seu afastamento do trabalho, deverá expedir ofício não apenas ao empregador informando sobre a necessidade de afastamento da mulher do trabalho para que receba pelos seus dias de afastamento, mas também ao INSS, para que passe a pagar à beneficiária o auxílio-doença pelo período remanescente.
Com o retorno, a mulher terá garantido todos os benefícios concedidos aos demais trabalhadores durante o período de afastamento, inclusive, eventuais reajustes salarias percebidos.
As normas coletivas passaram a incluir previsões especiais para mulheres nessa situação, então, averiguá-las para verificar se existem disposições específicas é necessário.
Recentemente, o Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais divulgou notícia sobre um caso em que determinou a reversão da justa causa por abandono de serviço, aplicada à trabalhadora que se ausentou por diversas vezes do trabalho em decorrência das situações vivenciadas com o seu cônjuge.
Além da reversão da justa causa, a trabalhadora foi reintegrada e determinado o pagamento de salários vencidos e vincendos, com obrigatoriedade do empregador de alterar o local do posto de trabalho.
Entendeu o Tribunal que as ausências da mulher estavam devidamente justificadas, ante aos diversos boletins de ocorrência juntados aos autos, e que demonstravam as violências e agressões sofridas do seu cônjuge.
Nesse caso em específico, não houve comunicação prévia do juiz da vara especializada em violência doméstica e familiar ou do juízo criminal ao empregador para comunicar a necessidade de afastamento da trabalhadora do posto de trabalho. E no caso, pergunta-se, teria a Justiça do Trabalho competência para apreciar esse requerimento de reversão de justa causa em razão de situação de vulnerabilidade da mulher, uma vez que para o STJ, o juiz competente para determinar esses afastamentos é o juízo especializado em violência doméstica e familiar e no caso não houve qualquer comunicado de afastamento?
É importante ter em mente que a Justiça do Trabalho não avaliou qualquer pedido ou necessidade de afastamento prévio do trabalho, mas apenas, avaliou se as faltas que ensejaram a justa causa eram justificadas ou não, as quais aliás, foram comprovadas nos autos. A Justiça do Trabalho assim procede em todos os casos que são de sua competência (EC.45.). Avalia a robustez e coerência das faltas graves que ensejam as dispensas motivadas, quando demandada sua jurisdição.
Ainda que não haja a determinação prévia de afastamento do trabalho em razão da segurança da mulher pelo juízo específico, nada impede que no curso do contrato, essas ausências sejam justificadas diretamente ao empregador, sem que contudo, sejam computadas e pagas como dias de trabalho. Apenas não serão registradas faltas que possam caracterizar abandono de emprego. É necessário balancear os ônus. Ao mesmo tempo que empregador não pode ser onerado com as ausências, a mulher não pode ser prejudicada em detrimento do seu estado de vulnerabilidade.
Caso a mulher pretenda o recebimento de benefício previdenciário e que o empregador arque com salário nos 15 primeiros dias, deverá seguir o trâmite processual via juiz da vara especializada em violência doméstica e familiar, e na falta deste, o juízo criminal, pois o empregador para promover o afastamento da trabalhadora pelo INSS, nestes casos, prescinde de comprovada recomendação de afastamento da mulher do trabalho.
É importante que as empresas mantenham canal de comunicação com suas trabalhadoras e abertura para abordar esses temas que em muitas das vezes são motivo de vergonha ou ameaça às mulheres.
É importante, antes de qualquer aplicação de justa causa ao trabalhador, que todas as documentações que ensejaram a dispensa sejam muito bem avaliadas à luz da legislação trabalhista. A justa causa é a penalidade mais gravosa que se pode aplicar ao trabalhador e por isso, é necessário que tenha contundência para se manter válida.
Uma boa dose de precaução nessas situações é o que se recomenda.
Um trabalho em conjunto com equipe de compliance e jurídico é o ideal para evitar dissabores e reversões de dispensas motivadas.







